Entre "petralhas", "coxinhas" e os "isentões", a crise política
brasileira tem sido motivo para fim de amizades, "textões" nas redes
sociais e muita, muita briga. E os artistas não passam incólumes no meio
da polêmica: querendo ou não, muitos acabaram no olho do furacão por
seus comentários a respeito do governo da presidente Dilma Roussef e do
impeachment.
A última vítima foi a atriz Letícia Sabatella. No início de abril, seu perfil no Facebook ficou dois dias fora do ar
após ser denunciado por internautas por "conteúdo abusivo" – poucos
dias após a atriz, que tem sido ativa em manifestações contra o
impeachment, participar de um evento em defesa da democracia, que contou
a presença da presidente.
Em uma postagem pública, o marido de
Sabatella, Fernando Alves Pinto, saiu em defesa dela e pediu "calma"
durante essa fase turbulenta: "[Ela] luta com tudo que pode por uma
Reforma Política que, entre outras mil prioridades, termine com a
corrupção. E é a pessoa mais transparente e de forte consciência
política e humana que tive a honra de conhecer. Precisamos de muita
calma e clareza, pra que essa nuvem passe com menos perdas e danos".
A calma, porém, nem sempre é a regra – e os conflitos políticos já
saíram das redes sociais para afetar os artistas também nas ruas. Em
dezembro, viralizou um vídeo no qual Chico Buarque discute política com
jovens no Rio de Janeiro. Ao deixar um restaurante na zona sul carioca, o
cantor foi abordado pelo grupo, que começou o bate-boca. "Vai morar em
Paris. O PT é bandido", disse um deles, ao que Chico respondeu: "Pra
mim, o PSDB é bandido".
Também acabou em confusão outra polêmica
que envolveu o cantor - dessa vez, indiretamente. Durante uma
apresentação de "Todos os Musicais de Chico Buarque em 90 Minutos", em
março, o diretor e ator Cláudio Botelho foi vaiado ao fazer um improviso
em cena, sugerindo a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e
chamando a presidente Dilma Rousseff de "ladra". O espetáculo foi
cancelado, a polícia foi chamada e o elenco teve de sair pelas portas
dos fundos do teatro, em Belo Horizonte, para evitar confusão.
Reações
O que chama a atenção, em todos os casos, é a reação do público. Em entrevista ao UOL na época do incidente, Claudio Botelho se
disse "assustado" com a forma como a plateia se comportou durante a
polêmica. "Estamos em 2016, ainda tem quem impede um espetáculo de
acontecer. Está restaurada a censura", criticou.
É
bom que se diga que jamais alguém veio me atacar pessoalmente na rua.
Os covardes só atacam na internet. O contrário acontece muito, recebo
elogios por minha postura
Roger, vocalista do Ultraje a Rigor
Roger, vocalista do Ultraje a Rigor
O Porta dos Fundos também sentiu a fúria dos espectadores após
publicar, no início do mês, o vídeo "Delação", em que os humoristas
satirizavam os trabalhos da Polícia Federal durante as investigações da
Lava Jato. O grupo sofreu uma campanha de boicote, e perdeu inscritos em
seu canal no YouTube.
Em um desabafo após o ocorrido, Antonio
Tabet, o Kibe Loco, criticou a intolerância dos opositores do grupo,
ressaltando que seus membros têm visões políticas diversas e que isso é
refletido nos vídeos.
"Quer evitar coxinhas? Não saia do seu
quarto. Quer evitar petralhas? Idem. Há pessoas dos dois lados aqui na
Porta, na Globo, na Band, na sua novela favorita, no supermercado que
você faz compras, no salão de beleza, na igreja que frequenta, na mesa
do bar, no time pelo qual você torce e, se duvidar, até no quarto do
lado. Esse revanchismo bobo só fomenta o ódio. Incentivar a censura ou a
intolerância nada mais é que um recibo de que você pode ser tão
fascista quanto os fascistas que critica. Sejam eles imperialistas
americanos ou comunistas cubanos".
Responsabilidade moral
Vocalista do Ultraje a Rigor, Roger Moreira vive uma situação bem
diferente da de seus colegas. Um dos artistas mais críticos ao governo
federal, ele tem recebido mais apoio do que ataques nesse momento de
polarização política. "Mais apoio. E, claro, eu bloqueio os ignorantes",
contou à reportagem do UOL. "Aprendi como agem. [A
polarização] não afetou em nada. É bom que se diga que jamais alguém
veio me atacar pessoalmente na rua. Os covardes só atacam na internet. O
contrário acontece muito, recebo elogios por minha postura".
O
cantor acredita que, assim como qualquer cidadão, os artistas também têm
o dever de fiscalizar o governo – e é isso que o leva a se pronunciar
com tanta veemência sobre o assunto.
"Nos anos 70, antes ainda
de eu ser artista, ouvíamos muito se falar em responsabilidade moral.
Significava que não temos realmente essa responsabilidade, não faz parte
de nosso ofício, por assim dizer, mas, como temos acesso ao grande
público e à imprensa, deveríamos esclarecer os ignorantes (note que
estou falando dos anos 70 e isso era o que se pensava, em tempo de
censura. Por ignorantes não se pretende uma ofensa, apenas falta de
informação). Bem, não se pode afirmar hoje em dia que os ignorantes
estejam de um lado só, mas ainda acho que é meu dever, como cidadão,
fiscalizar o governo. É dever de todos, na verdade."http://tvefamosos.uol.com.br/noticias/redacao/2016/04/22/alvos-de-haters-artistas-politizados-criticam-intolerancia.htm