O maior desejo dos jovens que agora se preparam para o vestibular do
Enem é conseguir vaga em universidade pública e gratuita. Para muitos,
essa é a única opção de subir alguns degraus na escala social, mesmo
saindo de famílias bastante pobres. Realizar esse sonho não é nada
fácil, já que, de acordo com dados do Inep, o número de vagas ofertadas
pelas instituições públicas é três vezes menor que as disponíveis nas
universidades privadas. Apesar disso, basta ver a mudança na vida de
algumas pessoas que superaram as dificuldades sociais e alcançaram o
diploma para entender que a concorrência vale a pena.
De família humilde de São Gonçalo, Vinícius
Araújo, de 30 anos, se formou em Medicina pela Uerj no final de 2014.
Ele sempre estudou em escolas públicas e, se fosse para pagar o curso,
jamais teria se tornado o médico que é hoje. “Eu não tinha condições.
Minha mãe é dona de casa e meu pai, relojoeiro”, conta. Ao fazer o
vestibular, Vinícius sentiu dificuldade por nem conhecer muitas matérias
cobradas em Biologia e Química, por exemplo. “O ensino básico público
deveria ser reformulado e todo mundo deveria ter acesso à educação
completa gratuita.”
Também aluna de escolas públicas, a advogada
Daiana Bastos, 34, se orgulha de ter conseguido se formar em Direito na
UFF. Para ela, os rumores sobre privatização das universidades públicas
ignoram os mais pobres que estão se matando de estudar para ocupar esses
espaços, como foi seu caso.
Para compensar as deficiências das
escolas públicas pelas quais passou, estudou sozinha, com livros do
Ensino Fundamental. Entrou na faculdade, passou na OAB. “Hoje tenho um
bom emprego, estou fazendo a segunda pós-graduação e pretendo nunca mais
parar de estudar”, garante.
Os jovens de baixa renda têm nas
cotas uma ferramenta para conseguir entrar nas universidades federais e
estaduais. Coordenador da ONG Educafro no Rio, Leizer Pereira diz que as
ações afirmativas tornaram mais diverso o ambiente do Ensino Superior.
Ele teme uma suposta privatização das instituições. “Por muito tempo
houve um monopólio das universidades públicas por parte das classes mais
altas e elas se acostumaram mal com isso”, acredita Pereira.
Acadêmicos contra fim da gratuidade
O professor
associado da Uerj/Faculdade de Educação da Baixada Fluminense Henrique
Sobreira argumenta contra a ideia do fim da gratuidade, que voltou a ser
discutida no meio político. “Se cobrar mensalidade resolvesse o
problema, não teríamos visto a falência de tantas universidades privadas
no Brasil”, destaca. “No exterior, o financiamento vem de contribuições
de ex-alunos, fundações e patentes de produtos intelectuais.”
Para
Renato Ferreira, mestre em Políticas Públicas pela Uerj, as
universidades têm que ser públicas, gratuitas e manter a qualidade. Em
meio à crise, porém, admite a cobrança de mensalidade daqueles com boas
condições financeiras.
“Universidades públicas
devem ser mantidas com recursos do governo, mas parece justo cobrar de
quem pode pagar”, defende. “É essa solidariedade que a elite brasileira
não tem, e é comum de se encontrar em outros países”, explicou.
Professor defende melhoria na rede básica
André
Tinoco, de 34 anos, veio de família em que a mãe trabalhou em casas de
família e o pai era porteiro. Estudou na Oficina do Saber da UFF e se
formou em Geografia pela Uerj. Hoje, é professor voluntário na primeira e
concursado na segunda.
O reforço do curso foi fundamental para
seu ingresso na graduação, por causa da fragilidade na rede básica do
ensino público. “A educação para os grupos de renda baixa é sucateada.
Os que estudam em colégios para classe média alta têm muito mais chances
de ingressar no Ensino Superior”, lamenta.
Tinoco defende a
melhoria da educação básica da rede pública e a criação de mais
mecanismos de acesso às universidades. Os crescentes rumores sobre o fim
da gratuidade o preocupam. “Só vai piorar a qualidade do ensino e
diminuir ainda mais o ingresso dos estudantes de baixa renda”, acredita.http://odia.ig.com.br/rio-de-janeiro/2016-07-31/mais-cobicadas-no-enem-as-universidades-gratuitas-podem-mudar-a-vida-dos-alunos.html