A
Proposta de Emenda à Constituição (PEC 55/2016) que limita os gastos
públicos pelos próximos 20 anos à correção da inflação do ano anterior
deverá aumentar a desigualdade social no país e impactar as políticas
sociais, na avaliação de economistas que participaram hoje (3) de
audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) no Senado.
Para
a professora de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ) Esther Dweck, a PEC está baseada em um diagnóstico equivocado
sobre a situação fiscal do país e vai piorar a distribuição de renda e a
possibilidade de recuperação da economia.
“A
política fiscal é crucial para a distribuição de renda. A distribuição
de renda não se dá pelo sistema produtivo. Ela se dá pela capacidade que
os estados têm de arrecadar parte da renda que foi gerada na economia e
redistribuir essa renda”, avaliou Esther, ex-secretária de Orçamento do
Ministério do Planejamento no governo da ex-presidenta Dilma Rousseff.
Para
a economista, o governo precisa intervir na desaceleração econômica e
não cortar mais despesas. Ela argumenta que a crise fiscal não é
resultado de um crescimento maior de despesas, mas de queda na receita
por causa da diminuição da arrecadação, decorrente da crise econômica.
“A
PEC não trata de arrecadação, não trata de pagamento de juros [da
dívida] e não trata de retomada do crescimento. Ao contrário, ela tende a
piorar a retomada do crescimento. Os únicos alvos da PEC são as
despesas primárias, que, no Brasil, são justamente o principal elemento
de distribuição de renda que a gente teve nos últimos tempos”, afirmou a
professora da UFRJ.
Segundo
a ex-secretária de Orçamento, a PEC propõe um corte sistemático das
despesas em proporção do Produto Interno Bruto (PIB), soma de todas as
riquezas produzidas pelo Brasil, o que vai afetar as despesas sociais.
“A ideia é que se reduzam em torno de 0,5% do PIB ao ano as despesas
primárias […]. O que mais cresceu nos últimos anos foram as despesas
sociais. No caso de saúde e educação, em relação aos mínimos, a gente
antes tinha um percentual fixo de receitas e agora eles necessariamente
vão cair.”
Conselho Federal de Economia
O
presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon), Júlio Miragaya,
reconhece a necessidade de o Brasil retomar o quanto antes o crescimento
econômico. “Evidentemente, todos estão cientes das consequências
sociais que a recessão econômica tem provocado nas pessoas,
particularmente o elevado índice de desemprego. Mas esse crescimento não
pode se dar a qualquer preço. Ele tem que preservar a inclusão social e
avançar na distribuição social e espacial da renda”, disse.
Para
o Cofecon, os gastos públicos primários da União têm contribuído para
diminuir as desigualdades, o que pode ser comprometido com o atual
formato da PEC 55.
“O
Brasil persiste como um dos países de maior desigualdade social e o
principal mecanismo da concentração da renda e da riqueza é nosso modelo
tributário, altamente regressivo, economicamente irracional e
socialmente injusto. Nós tributamos o consumo e a produção.
Economicamente, isso é irracional. Os países, no mundo inteiro, tributam
a renda e a riqueza e, aí, passa a ser socialmente justo. Nós adotamos
um caminho inverso”, afirmou Miragaya.
Para
o economista, em vez de debater a reforma tributária, o governo traça
um falso diagnóstico para a crise, identificando “uma suposta e
inexistente gastança do setor público, responsabilizando despesas com
saúde, educação, previdência e assistência social pelo aumento do
déficit”.
“Dessa
forma, omite as efetivas razões, que são os gastos com juros da dívida
pública, responsáveis por 80% do déficit nominal – no último ano, porque
anteriormente era mais ainda, até porque tínhamos superávit primário –,
as excessivas renúncias fiscais, o baixo nível de combate à sonegação
fiscal, a frustração da receita”, destacou o presidente do Cofecon.
“Para
buscar o reequilíbrio das contas públicas, o governo Temer propõe um
conjunto de ações cujos efeitos negativos recairão sobre a população
mais vulnerável, sendo a PEC 55 uma das principais”.
Governo
O Ministério da Fazenda foi convidado para participar da audiência na CAE, mas não enviou representante.
A
PEC do Teto propõe um novo regime fiscal para o país, em que o aumento
dos gastos públicos, em um ano, esteja limitado pela inflação do ano
anterior. O governo, autor da proposta, defende a medida como
fundamental para o controle da dívida pública e a retomada de confiança
na economia e nega que ela vá retirar recursos de áreas como saúde e
educação.
O
relator da PEC 55/2016 na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania
(CCJ) do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), apresentou na terça-feira
(1º) parecer favorável à aprovação do texto na Casa. Eunício manteve o texto original que veio da Câmara
para que a proposta não tenha que voltar para a análise dos deputados. O
objetivo é que a PEC entre em vigor o mais breve possível.
Eunício
afirmou que a proposta não vai cortar gastos de áreas como saúde e
educação. “Nem saúde nem educação perdem recursos. É balela dizer que
essa PEC corta gastos. Ela não corta um centavo ao nível de hoje. Ela
disciplina gastos para o futuro: começa pelo piso que gasta hoje e
corrige pela inflação do ano anterior”, disse.
O
texto foi aprovado em dois turnos pela Câmara dos Deputados e
encaminhado ao Senado na semana passada. Na Câmara, a PEC tramitou com o
número 241 e, no Senado, ganhou o número 55.https://br.noticias.yahoo.com/pec-teto-deve-aumentar-desigualdade-175200591.html