Em 2016, a atuação do Ministério Público Federal em Volta Redonda
procurou dar efetividade aos direitos humanos na área de educação, por
meio de duas atuações singulares: o combate à LGBTfobia nas escolas do
sul fluminense e a atuação em defesa do Estado laico nas escolas de
Barra Mansa.
Em junho, o Ministério Público Federal (MPF) em Volta Redonda (RJ)
expediu recomendação às prefeitura dos municípios da região Sul
Fluminense - Barra Mansa, Barra do Piraí, Engenheiro Paulo de Frontin,
Mendes, Miguel Pereira, Paracambí, Pinheiral, Piraí, Rio Claro, Rio das
Flores, Valença e Vassouras - para que fossem instituídos grupos de
trabalho, com a participação da sociedade civil, dos sindicatos de
profissionais da educação e do movimento LGBT para elaborar diretrizes
que orientem os sistemas de ensino municipais na implementação de ações
que garantam o respeito ao cidadão e à cidadã, e à não-discriminação por
orientação sexual.
As ações devem contemplar as diretrizes do programa federal “Brasil
sem Homofobia” e do plano de combate à homofobia, como a avaliação dos
livros didáticos, de modo a eliminar aspectos discriminatórios por
orientação sexual e a superação da homofobia, e o estímulo à produção de
materiais educativos (filmes, vídeos e publicações) sobre orientação
sexual e superação da homofobia.
A maioria dos municípios já está cumprindo a recomendação. Barra do
Piraí, Vassouras e Pinheiral vêm discutindo com mais afinco o
cumprimento da recomendação, já realizaram algumas reuniões, com a
participação do MPF, e estão elaborando ações para a capacitação dos
educadores e a sensibilização das comunidades escolares locais. "A
execução de tais medidas passa por um processo de desconstrução de
certas pré-compreensões, que devem ser objeto de discussão entre os
profissionais", afirma o procurador da República Julio José Araujo
Junior, que conduz inquérito civil sobre o tema.
Em Volta Redonda, o MPF apresentou subsídios para o ajuizamento de
representação de inconstitucionalidade contra lei que proibiu a chamada
"ideologia de gênero" nas escolas do município. A Defensoria do Estado
do Rio de Janeiro encampou os argumentos e propôs ação perante o
Tribunal de Justiça, que deve ser julgada em 2017. A ação já conta com
manifestação favorável pela inconstitucionalidade do Estado do Rio de
Janeiro e da Procuradoria-Geral de Justiça. "A terminologia ideologia de
gênero é totalmente equivocada, serve unicamente para continuar
perpetuando a desigualdade de gênero e impedir uma discussão séria sobre
sexualidade", ressalta o procurador. "É possível ressaltar que a pura e
simples vedação da chamada “ideologia de gênero” para atender a pleitos
religiosos que preconizam a visão de que haveria uma proteção da
família desconsidera o entendimento constitucional sobre a matéria,
colocando em risco o âmbito de proteção do direito fundamental à
igualdade, em sua vertente do reconhecimento. Note-se que não se trata
de invocar a inconstitucionalidade em razão da obrigatoriedade da
chamada ideologia de gênero, mas sim de rechaçar a proibição, na foma
como apresentada, em razão do risco de esvaziamento do âmbito de
proteção do princípio da igualdade", afirma.
Laicidade nas escolas - Em setembro deste ano, a
Secretaria Municipal de Educação de Barra Mansa, atendendo à
recomendação do Ministério Público Federal (MPF) em Volta Redonda (RJ),
vetou a imposição de oração do "pai nosso" em escola local. A
recomendação foi expedida em inquérito civil público que tratava da
prática diária da oração na escola pública CIEP 054. A família de um
aluno que não praticava essa oração manifestou incômodo com a prática e
com a participação compulsória dos alunos. Em visita à escola pelo MPF
para verificar como estava sendo tratada a religião no CIEP 054, bem
como regular funcionamento do serviço de educação na unidade, a diretora
da escola informou que a decisão de incluir o “pai nosso” na rotina dos
alunos tinha como objetivo acalmá-los na entrada nas salas de aula e
auxiliar na disciplina dos discentes. Ao ser indagada se os alunos eram
convidados ou levados a participarem
O MPF visitou a instituição de ensino e a diretora informou que a
decisão de incluir a oração teria como objetivo acalmar os alunos na
entrada nas salas de aula e auxiliar na disciplina dos discentes. Ao ser
indagada se os alunos eram convidados ou levados a participarem da
oração, a diretora informou que a integração com a prece era
obrigatória. Para o MPF, a prática de tal oração dentro da escola
acabaria por coagir e constranger os alunos a participarem de sua
realização, em sua liberdade de crença e convicções, tendo em vista o
disposto na convenção sobre direitos da criança, que prevê que a
formação do ser humano deve ser orientada no sentido de prepará-lo para
assumir uma vida responsável, numa sociedade livre, com espírito de
compreensão, paz, tolerância, igualdade de sexos e amizade entre todos
os povos, grupos étnicos, nacionais e religiosos, e pessoas de origem
indígena. "Fica claro raciocinar que crianças e adolescentes por todo o
Brasil podem não estar conseguindo concretizar suas escolhas religiosas
por receio de enfrentarem constrangimentos diante dos professores e
companheiros de classe. Afinal, trata-se de um período de formação de
interesses e aptidões de um indivíduo, que muito são influenciados pela
autoridade do professor e pela companhia dos demais alunos", sustenta o
parecer que embasa a recomendação.
O documento ressalta também que é proibido ao Estado fazer ou
permitir que se faça, no ambiente da escola pública, doutrinamento,
pregação, conversão, evangelização, catequese ou quaisquer outras ações
do gênero, mesmo que para efeitos de controle, porque tais atitudes
violam o dever de imparcialidade do Estado.
A recomendação pede a adoção de procedimento que respeite a laicidade
em todas as escolas do município. A secretaria de educação acolheu as
orientações e vem observando os fundamentos expostos n parecer do MPF.